Gosto de ti, quero-te e... outros extras com que metemos golos na própria baliza
"-Vamos falar dos sentimentos que, desde sempre, se passeiam dentro de nós. Do perigo que representa fugirmos aos nossos sentimentos, à linguagem dos olhos, ao tocar, ao "desejo-te" ou ao "quero-te", a tudo aquilo que, das duas uma: ou nos leva a estar perto ou nos empurra para longe uns dos outros. - Isso não é um bocadinho "ou carne ou peixe", "ou tudo ou nada"? Para além do perto ou do longe, os nossos sentimentos não darão outras alternativas à relação entre as pessoas? -Dão. Dão o "politicamente correcto" e o "demasiado perto", que são duas formas batoteiras de usarmos os sentimentos para estarmos longe das pessoas. (...) É. O demasiado perto é uma estranha forma de estar longe, estando "em cima" de alguém. E, se reparar, na relação entre as pessoas, o demasiado perto é longe demais. (...) Só há dois tipos de abraços: os que tiram o ar e os que enchem a alma. Confiarmos o nosso corpo a alguém traz tanto medo que um abraço raramente é um gesto firme e apertado entre duas pessoas. Muitos - mesmo muitos - de nós evitam os abraços porque os sentem como gestos tensos, contrafeitos e - sobretudo - como uma proximidade grande demais, que traz medo. Como se o estar perto fosse, para tantas pessoas, tão pouco vivido e experimentando que temem que um abraço lhes roube o ar, em vez de encher a alma. (...) As pessoas têm muito medo que os sentimentos sejam uns extras estranhos com que vêm equipadas! Na verdade, toda a nossa educação se dirigiu no sentido de aprendermos a reprimir aquilo que sentimos. Como se fosse possível sentirmos a beleza do mundo e a das pessoas de uma forma asséptica ou bacteriologicamente pura. Já viu como, fugindo dos nossos sentimentos, fugimos de tudo o que nos permite namorar com a vida? Já viu como fomos todos educados para metermos golos na nossa baliza? (...) Trabalho para casa: descubra o lado pimba que há em si! A sério: fiquem com uma equação para o fim-de-semana. A equação é: como se diz "gosto de ti" cm sinais de fumo? Não será melhor voltarmos ao Jurássico e dizer "gosto de ti" de forma desajeitada, atabalhoada, mas com alma e de olhos nos olhos? Não faz sentido tantos cuidados, quando se trata de nos chegarmos a alguém. Em suma: Não é possível amar, dizendo "gosto de ti" pelo canto do olho!"
És meu, só meu, meu e de mais ninguém
"-Vamos falar de ciúme. E vou já acordá-la dizendo que o ciúme faz melhor que o "Cola Cao". O ciúme é a versão "ultra light" da gula. Na verdade - aqui que ninguém nos ouve -, quando gostamos muito de alguém, queremos essa pessoa toda, toda, toda só para nós.
-Claro que queremos a pessoa toda só para nós. E por isso mesmo custa-me a perceber que o ciúme faça bem. O ciúme faz doer, cansa, e pode mesmo ser destrutivo.
-Se formos espertos, sabemos que o ciúme nos ajuda a perceber que, se dividirmos um bocadinho da pessoa de quem gostamos muito com mais alguém (só um bocadinho), saímos a ganhar. E sempre que não toleramos dividi-la, isso não quer dizer que não tenhamos dúvidas sobre ela, mas que estamos tão inseguros do que valemos para ela que mais vale não a deixar fazer quaisquer comparações porque, senão, perdemos a taça para o mais enfadonho dos companheiros do mundo.
-Mas o que é isso de dividir a pessoa um bocadinho?
-Dividir um bocadinho é perceber que uma pessoa só tem de ser toda nossa quando não faz parte de nós.
-Bom, e depois há aquelas pessoas que respiram ciúme, que se alimentam de ciúme, que são só ciúme, e destroem qualquer relação.
-O ciúme é humano. O delírio de ciúmes é demoníaco. Essas pessoas são pessoas doentes. Pessoas certamente tão marcadas por inúmeras decepções que, para não enlouquecerem com tudo o que as leva a desconfiar do que sentem, desconfiam compulsivamente de quem gosta delas.
-Provavelmente são pessoas com uma auto-estima tão pequenina, tão pequenina, que dificilmente conseguem acreditar que alguém possa, realmente, gostar delas e só delas. Mas quando não é patológico , o ciúme pode ser uma espécie de acendalha de uma relação. Uma chamazinha de ciúme põe-nos em causa, e isso faz com que não nos deixemos "dormir em serviço". Sentir o tapete fugir-nos levemente por debaixo dos pés pode ter essa grande vantagem de nos estimular, não é? De tentarmos conquistar - todos os dias - a pessoa de quem gostamos.
-É. sobretudo porque o ciúme é uma forma de dizermos por outras palavras: "Tenho medo que não gostes de mim!"
O amor é fogo!
"-Quantas paixões devia ter um adolescente antes de descobrir a cara-metade?
-O dia tem 24 horas... Se ele (ou ela) tiver uma paixão de 12 em 12 horas, isto dá...730 paixões por ano! Agora, a sério: Um adolescente devia ter imensos flirts, muitas paixões e alguns namoros. E os namorados, só dão inquietações e insucesso escolar?
-Não, absolutamente! Os namorados dão inquietações, dão insónias, podem dar algumas desatenções nos estudos, mas são o melhor que há para crescer com saúde. Porque é que os adolescentes falam mais facilmente com um amigo ou com uma amiga, por exemplo, do que com o pai ou com a mãe?
-Porque só contamos o mais secreto dos nossos pensamentos a quem desvenda os segredos do nosso coração.
-Ora essa! E quem melhor que o pai ou a mãe para nos conhecer e desvendar o nosso coração?
-O melhor amigo. A confidente. A namorada. Sabe porquê? Porque, para muitos pais, o coração dos adolescentes é um "abre-te sésamo" sem password.
(...) Quando alguém diz - por palavras, actos ou omissões - "não gosto de ti!", está a dizer:"Luta por mim!"... Duas vezes."

Pecar é gostar duas vezes
"(...)Quando se gosta muito de alguém, não se faz um voto de castidade com a vida. Gostar de outra pessoa torna-nos mais sensíveis à beleza: dentro de nós próprios, dentro de quem gostamos e à nossa volta. "Peca-se" mais. E é bom que possamos dizer que pecar (desta maneira) nos vira do avesso. Mas dá sol, por dentro. Obriga-nos a pôr as pessoas de quem gostamos em dúvida. Não deixa que "adormeçamos em serviço" e empurra-nos para questões que nos ensinaram a proibir. Como, por exemplo: Que ganhos me trouxe a pessoa com quem estou? Tornou-me melhor, ensinou-me a ser mais bonito, trouxe-me mais vida? Ou, pelo contrário, mesmo sem querer, levou-me a "deitar fora" tudo aquilo que me arejava a cabeça e tornava o meu coração mais bonito? -Mas não será que pecamos apenas quando o desinteresse por aquela pessoa já se instalou irremediavelmente? Não é desconfortável pecarmos - mesmo que só por pensamentos - tendo, ao lado, o escolhido ou a escolhida? -Pecar (visto desta maneira) é "tão natural como a sua sede" e - sim! - é desconfortável pecar, porque os remorsos fazem um formigueiro no coração, mas são as melhores vitaminas de uma relação. Visto assim, pecar é dizer "gosto e ti"... Duas vezes. Nunca se esqueça: os piores pecadores são os que pecam sem remorsos, e aqueles que sentem remorsos... ainda antes de pecarem."