
quarta-feira, 30 de dezembro de 2009
... em busca do meu eu (?)

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009
Cativa-me *

"... - Quem és tu? - perguntou o principezinho - És bem bonita...
- Sou uma raposa - disse a raposa.
- Anda brincar comigo - pediu-lhe o principezinho - Estou tão triste...
- Não posso ir brincar contigo- disse a raposa- Ainda ninguém me cativou...
- AH! Então, desculpa! - disse o principezinho.
Mas pôs-se a pensar, a pensar, e acabou por perguntar.
- "Cativar" quer dizer o quê?
- Vê-se logo que não és de cá - disse a raposa - de que andas tu à procura?
- Ando à procura dos homens - disse o principezinho. - "Cativar" quer dizer o quê?
- É uma coisa de que toda a gente se esqueceu- disse a raposa. - Quer dizer "Criar laços"...
- Criar laços?
- Sim, laços - disse a raposa. - Ora vê, por enquanto tu não és para mim senão um rapazinho perfeitamente igual a cem mil outros rapazinhos. E eu não preciso de ti. E tu também não precisas de mim. Por enquanto eu não sou para ti senão uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativares, passamos a precisar um do outro. Passas a ser único no mundo para mim. E eu também passo a ser única no mundo para ti...
Estás a ver aqueles campos de trigo ali adiante?
Eu não gosto de pão e, por isso, o trigo não me serve para nada.Os campos de trigo não me fazem lembrar nada. E é uma triste coisa! Mas os teus cabelos são da côr do ouro. Então, quando tu me tiveres cativado, vai ser maravilhoso!O trigo é dourado e há-de fazer-me lembrar de ti. E hei-de gostar do som do vento a bater no trigo...
A raposa calou-se e ficou a olhar para o principezinho durante muito tempo.
- Se fazes favor... Cativa-me! - acabou finalmente por pedir.
- Eu bem gostava - respondeu o principezinho, - mas não tenho muito tempo - tenho amigos para descobrir e uma data de coisas para conhecer...
- Só conhecemos o que cativamos - disse a raposa.
- E tenho de fazer o quê? - disse o principezinho.
- Tens de ter muita paciência. Primeiro, sentas-te longe de mim, assim, na relva. Eu olho para ti pelo canto do olho e tu não dizes nada. A linguagem é uma fonte de mal entendidos. Mas podes-te sentar cada dia um bocadinho mais perto...
O principezinho voltou no dia seguinte.
- Era melhor teres vindo à mesma hora - disse a raposa.
- Por exemplo, se vieres às quatro horas, às três, já eu começo a estar feliz - E quanto mais perto fica da hora, mais feliz me sinto. Às quatro em ponto hei-de estar toda agitada e toda inquieta: fico a conhecer o preço da felicidade! Mas se chegares a uma hora qualquer, eu nunca vou saber a que horas hei-de começar a arranjar o meu coração, a vesti-lo, a pô-lo bonito... "
O Principezinho
Antoine de Saint-Exupéry